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2016
Quando Marcos Falcon anunciou a contratação de Paulo Barros, muitos portelenses torceram o nariz. A imprensa noticiou com espanto, pois, sempre uma escola tradicional, parecia impossível unir os estilos da Portela e do inovador carnavalesco. Junto com o artista, vieram os coreógrafos Sandrini e Roberta, que sempre o acompanhavam para ensaiar os componentes de alas e alegorias. Contudo, na Portela eles também acumulariam a função de coreógrafos da comissão de frente, iniciando uma parceria com Gislaine Cavalcante, que permanecia no cargo. Outra novidade foi a permissão para o compositor Samir Trindade, com seu vitorioso histórico no carnaval, sobretudo na Beija-Flor, participar da disputa de samba. No dia da final, diante da multidão ansiosa pelo resultado, o vice-presidente Marcos Falcon apenas declamou um trecho da obra vitoriosa, sendo acompanhado de forma uníssona por toda a quadra. Sucesso absoluto, o samba escolhido, que, além dos estreantes Samir Trindade, Elson Ramires, Lopita 77, Dimenor e Edimar Jr, contava também com o veterano Wanderley Monteiro, não só garantiu a nota máxima dos jurados, como conquistou os principais prêmios do carnaval carioca, incluindo o consagrado Estandarte de ouro.
Para o sucesso alcançado, o samba, além da poética descrição do enredo “No voo da Águia, uma viagem sem fim...”, desenvolvido por Paulo Barros e sua equipe, seguramente foi fundamental o desempenho do carro de som. Além de Wantuir, pelo terceiro ano seguido como intérprete da Portela, o ano de 2016 marcou o retorno de Gilsinho, que substituiu Wander Pires logo após o concurso de samba. De fato, o samba explodiu as arquibancadas e possibilitou a nota máxima nos quesitos harmonia e evolução. Em relação à direção de harmonia, a Portela promoveu uma mudança radical. A nova comissão, que substituía Jorge Pitanga, Washington e Leandro Germano, reunia o consagrado e talentoso Jerônimo Patrocínio; os responsáveis pela ala de passistas, Nilce Fran e Valdir Pelé; os antigos membros do Departamento de Comunidade, Márcio Emerson, Jorge Barbosa, Sérvolo Alves e Walter Moura, além de Leonardo Brandão, membro da harmonia promovido. A reformulação do setor contou também com a contratação de Tavinho Novelo, que, após vitoriosas passagens por outras agremiações na função de diretor de carnaval, integraria na Portela o novo grupo que se formava. A maior parte dos antigos componentes deste segmento foi substituída, em parte, pela inclusão dos até então responsáveis pelas alas de comunidade. Ao ser anunciada, muitos desconfiaram da eficácia destas mudanças não muito ortodoxas, mas, após o resultado do desfile, ficou evidente o desempenho positivo.
Na direção de carnaval, Luiz Carlos Bruno permaneceu no cargo para comandar seu terceiro desfile na Portela. Desta vez, ele reestabeleceria a velha parceria com Paulo Barros. A dupla fez sucesso na Unidos da Tijuca, exatamente nos primeiros anos do carnavalesco no Grupo Especial. Para aprimorar o desempenho na avenida, Luiz Carlos Bruno e sua equipe, que contava com Fábio Pavão, Claudinho Portela e Moisés Carvalho, organizaram um ousado planejamento de ensaios para a chamada “cabeça da escola”. Com as obras na Zona Portuária perto da conclusão, a Portela aproveitou o fato da via Expressa Rodrigues Alves, especialmente no trecho em frente à Cidade do Samba, já estar completamente pronta e sem movimento, uma vez que aguardava a conclusão de outros trechos para ser inaugurada, e solicitou autorização para ensaiar semanalmente no local. Assim, escondida do público, nas largas pistas da nova via, a Portela, com o apoio logístico da concessionária Porto Novo, deslocava uma carreta, alugada para ser transformada em elemento cenográfico da comissão de frente, uma empilhadeira, que levaria a escultura da Águia, um tripé, que representaria o Monte Sinai, e um carro pipa, contratado para encher o tanque construído para a surpresa da comissão de frente. Além de ajustar os efeitos da Comissão e o casal, a primeira ala, que se abria para a passagem da empilhadeira com a Águia, também foi exaustivamente ensaiada neste espaço. Por fim, apesar da complexidade da operação, tudo foi preparado para proporcionar um desfile impecável, inclusive em relação ao tempo de evolução ao longo da avenida, fielmente reproduzido na tranquilidade da via expressa ainda desativada.
Quando a Portela pisou o chão da Marques de Sapucaí, na segunda-feira de carnaval, a arquibancada explodiu de alegria. Impulsionado por um jet-ski, um ator representando Poseidon levitava com a força das águas, num criativo efeito típico do carnavalesco Paulo Barros. Descrevendo de forma poética a Odisseia de Homero, os demais componentes da comissão, para demonstrar os mares revoltos, promoviam uma “dança das águas” a partir de seus chapéus, molhando a pista para a apresentação do primeiro casal de Mestre-sala e Porta-bandeira, Danielle Nascimento e Alex Marcelino. Esta foi a grande polêmica daquele ano, sobretudo após a leitura das notas. Na sequencia, enquanto o mar vermelho se abria, a grande Águia, conforme fora exaustivamente ensaiado, atravessava a primeira ala carregando um ator representando Moisés, soltando seu inconfundível grito ao alcançar o alto do Monte Sinal. Desenvolvida pelos artistas de Parintins, um problema na parte mecânica, ainda diante do setor 01, fez com que a ave tivesse seus movimentos comprometidos, desfilando estática. O carro abre-alas, representando o Egito, completava o primeiro setor trazendo componentes girando em estruturas de ferro, evidenciando outra característica marcante de Paulo Barros.
O desfile prosseguia mostrando os povos antigos que atravessaram o mar, como fenícios, chineses ou mesmo os europeus. O segundo carro, representando os perigos do mar, trouxe um barco que adernava em plena avenida, com os componentes, bem ensaiados, simulando as tormentas enfrentadas pelos tripulantes. A encenação tirou o fôlego do público, sendo ovacionada. Este setor também apresentou o segundo casal de mestre-sala e porta-bandeira, Marlon Flores e Rosilaine Queiroz, com fantasias inspiradas nos vikings.
O setor seguinte apresentou as “viagens imaginárias”, tema tratado pelo carnavalesco com bom humor, abusando das referencias a filmes de hollywood e obras literárias. O terceiro casal de mestre-sala e porta-bandeira, Douglas Barbosa e Camylla Nascimento, desfilou neste setor, com fantasia retratando as “viagens estelares”. Após abordar às viagens no tempo, no espaço ou no fundo do mar, a terceira alegoria, chamada “As viagens de Gulliver”, trazia um boneco gigante que ficava em pé na avenida. As composições, também exaustivamente ensaiadas, penduradas no corpo da escultura, pareciam verdadeiramente pequenas, gerando o efeito pretendido pelo carnavalesco. O resultado foi mais uma vez a consagração junto ao público das arquibancadas.
O terceiro setor tratava das viagens extremas, lembrando as dificuldades e percalços enfrentados por aqueles que atravessam ambientes hostis, como a Antártica, a Amazônia e os desertos. A bateria, comandada por mestre Nilo Sérgio, tendo a frente à Rainha Patrícia Neri, em seu quarto ano como soberana da Tabajara do Samba, desfilou com uma fantasia representando um safari pela África, obtendo um desempenho espetacular. A quarta alegoria, assim como a ala que a precedeu, mostrava uma nova fronteira para as viagens extremas, que é a aridez do planeta Marte. Trazendo os personagens da clássica série “Perdidos no espaço”, a alegoria tinha mais de quarenta robôs que balançava seus braços de forma coordenada na avenida.
No quarto setor, a busca por mundos perdidos foi apresentada com fantasias retratando o Santo Graal, a Ilha de páscoa, o exército de Terracota e outras descobertas arqueológicas que permitem uma viagem ao passado distante. A quinta alegoria, “Elo perdido”, trazia uma bem humorada referência ao Jurassic Park, com dinossauros abrindo suas bocas e devorando arqueólogos, novamente alcançando grande sucesso.
O quinto setor se chamava “O mapa da mina – em busca de riquezas”, e, como o título sugere, mostrava as viagens feitas pelos seres humanos em busca de riqueza, como a rota da seda, a rota das especiarias e o caminho do ouro. Fechando o setor, o carro “Eldorado” apresentava uma encenação em que, no alto da alegoria, um invasor espanhol, após lutar com um Inca, despencava num fosso, fazendo o público mais uma vez prender a respiração.
O sexto e último setor, mostrava a complexidade das viagens no mundo moderno, com a era da internet, os avanços dos meios de transporte e o surgimento de cidadãos que, vivendo cada dia num lugar diferente, cumprindo suas agitadas agendas de trabalho, são na verdade cidadãos do mundo, desenraizado de suas origens. A última alegoria, “Aonde você me levar eu vou”, mostrava um avião sobrevoando a Terra. Era o carro que trazia a tradicional velha guarda da Portela, fechando o desfile.
Ao final, aclamada por público e imprensa, a majestade do samba arrancou fortes gritos de “É campeã” por todo o percurso, deixando a avenida como favorita ao título. A vigésima segunda estrela nunca esteve tão próxima! A expectativa era grande, mas, após a leitura das notas, a Portela perdeu, considerando os descartes, um décimo nos quesitos Comissão de frente, Enredo e Mestre-sala e porta-bandeira. Os três décimos perdidos deixaram a Portela na terceira colocação, com um a menos que a Campeã, Mangueira, e empatada em segundo lugar com a Unidos da Tijuca, mas perdendo nos critérios de desempate. Apesar da frustração, os portelenses sabiam que o título estava próximo. Era só uma questão de tempo. Quem sabe em 2017?
FICHA TÉCNICA:Presidente: Sérgio Procópio
Vice-presidente: Marcos Falcon
Carnavalesco: Paulo Barros
Diretor de Carnaval: Luis Carlos Bruno
Equipe de direção de carnaval: Fábio Pavão, Moisés Carvalho e Claudinho Portela.
Comissão de harmonia: Tavinho Novelo, Jerônimo do Patrocínio, Léo Brandão, Nilce Fran, Valcir Pelé, Márcio Emerson, Jorge Barbosa, Sérvolo Alves e Walter Moura.
1º Casal de mestre-sala e porta-bandeira: Alex Marcelino e Danielle Nascimento
Coreógrafo do 1º casal: Fábio Costa
Intérpretes: Wantuir e Gilsinho
Mestre de bateria: Nilo Sérgio
Rainha de bateria: Patrícia Neri
Coreógrafos da comissão de frente: Ghislaine Cavalcante, Marcelo Sandrini e Roberta Nogueira.
Diretor de barracão: Moisés Carvalho
2º Casal: Marlon Flores e Rosilaine Queiroz
3º Casal: Douglas Barbosa e Camylla Nascimento
Responsável pela ala das baianas: Jane Carla.
Responsável pelos passistas: Valcir Pelé e Nilce Fran
1º Destaque: Carlos Reis
Coordenador de Destaques: Carlos Ribeiro
Ala de compositores Ary do Cavaco: Jane Garrido, Arlindão e Walter Alverca
Departamento Feminino: Aldalea Rosa Negra da Portela
Galeria da Velha Guarda: Zilmar de São JustoSamba-enredo
Compositores: Samir Trindade, Wanderley Monteiro, Elson Ramires, Lopita 77, Dimenor e Edmar Jr.Voar nas asas da poesia
Rasgar o céu da mitologia
E nessa Odisseia viajar
Meus olhos vão te guiar, na travessia
E no meu destino sem fim
Cruzar o azul que é tudo pra mim
Enfrentar tormentas e continuar a navegarOh, leva eu, me leva, a
onde o vento soprar, eu vou
Oh, leva eu, me leva, s
ou livre, aonde sonhar, eu vouQuisera ir ao infinito
Sentir lugares tão bonitos
Em terras mais distantes me aventurar
Sem saber se um dia vou voltarE mais além, no elo perdido cheguei
No vai e vem, a chave da vida encontreiVou pedir passagem
Em busca do ouro
O seu brilho me fascina
Quero esse mapa da mina, pra achar tesouros
Abre a janela, pro mundo que Paulo criou
Do outro lado alguém pode ver esse amor
Meus filhos vêm me adorar
O samba reverenciar
Abram alas, vou me apresentarEu sou a Águia, fale de mim quem quiser
Mas é melhor respeitar, sou a Portela
Nessa viagem, mais uma estrela
Que vai brilhar no pavilhão de Madureira
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